03 janeiro, 2012

BRASIL

Nesta hora de sol puro
palmas paradas
pedras polidas
claridades
faíscas
cintilações
Eu ouço o canto enorme do Brasil!

Eu ouço o tropel dos cavalos de Iguaçu


correndo na ponta das rochas nuas,

empinando-se no ar molhado,

batendo com as patas de água na

manhã de bolhas e pingos verdes;


Eu ouço a tua grave melodia, a tua
bábara e grave melodia, Amazonas,

a melodia da tua onda lenta de óleo

espêsso, que se avoluma e se avoluma,

lambe o barro das barrancas, morde
raízes, puxa ilhas e empurra o oceano mole como um touro picado

de farpas, varas, galhos e folhagens;

Eu ouço a terra que estala no ventre

quente do nordeste, a terra que ferve na planta do pé de bronze do

cangaceiro, a terra que se esboroa e rola em surdas bolas pelas estradas

de Juàzeiro, e quebra-se em crostas

sêcas, esturricadas no Crato chato;

Eu ouço o chiar das caatingas — trilos,

pios, pipios, trinos, assobios,

zumbidos, bicos que picam, bordões

que ressoam retesos, tímpanos que

vibram límpidos, papos que estufam,
asas que zinem, zinem rezinem,

cris-cris, cicios, cismas, cismas longas,

langues — caatingas debaixo do céu!

Eu ouço os arroios que riem, pulando

na garupa dos dourados gulosos,

mexendo com os bagres no limo das

luras e das locas;

Eu ouço as moendas espremendo canas,

o glu-glu do mel escorrendo nas

tachas, o tinir da tigelinhas nas

serigueiras;
e machados que disparam caminhos,
E serras que toram troncos,
E matilhas de “Corta Vento”,

“Rompe-Ferro”, “Faíscas” e

“Tubarões” acuando suçuaranas e maçarocas,
e mangues borbulhando na luz,
e caititus tatalando as queixadas para

os jacarés que dormem no tejuco morno dos igapós...


Eu ouço todo o Brasil cantando,

zumbindo, gritando, vociferando!
Rêdes que balançam,
sereias que apitam,
usinas que rangem, martelam, arfam,

estridulam, ululam e roncam,
tubos que explodem,
guindastes que giram,
rodas que batem,
trilhos que trepidam.
rumor de coxilhas e planaltos,

campainhas, relinchos aboiados e mugidos,

repiques de sinos, estouros de foguetes,

Ouro Preto, Bahia, Congonhas,

Sabará,
vaias de Bôlsas empinando números

como papagaios,
tumulto de ruas que saracoteiam sob arranha-céus,
vozes de tôdas as raças que a maresia

dos portos joga no sertão!

Nesta hora de sol puro eu ouço o Brasil.
Todas as tuas conversas, pátria morena, correm pelo ar...
a conversa dos fazendeiros nos cafèzais,
a conversa dos mineiros nas galerias

de ouro,
a conversa dos operários nos fornos de

aço,
a conversa dos garimpeiros, peneirando

as bateias,
A conversa dos coronéis nas varandas

das roças...


Mas o que eu ouço, antes de tudo, nesta

hora de sol puro
palmas paradas
pedras polidas
claridades
brilhos
faíscas
cintilações


é o canto dos teus berços, Brasil, de

todos êsses teus berços, onde dorme,

com a boca escorrendo leite, moreno,

confiante,

o homem de amanhã!

Poesia de Ronald de Carvalho-1893-1925
Do livro: Tesouro da Juventude-W.M. Jackson, INC
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